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Advento e consolação

Tempo do Advento, preparação para o Natal, é oportunidade singular de se fazer a experiência da consolação, aquela consolação que articula a consciência do limite humano, iluminando a necessidade de se buscar um horizonte novo para a vida. Inspiradora é a convocação do apóstolo Paulo, escrevendo aos Romanos, quando diz que “a noite está quase passando, o dia vem chegando: abandonemos as obras das trevas e vistamos as armas da luz”. Buscar consolação não significa fazer “vista grossa” para atos na contramão do amor. Trata-se de adotar nova dinâmica capaz de conduzir a vida pessoal e as relações familiares, comunitárias, sociais a um novo tempo. O profeta Isaías tem uma maestria poética e pedagógica nesta indicação, quando ensina que a retomada da obediência do mandamento de Deus permite experimentar um rio de paz e justiça tão abundante como as ondas do mar. Assim, buscar ser obediente a Deus, cultivando consolação, não joga ninguém no abismo da lamúria ou da amargura, com considerações similares aos juízos sobre os outros. É exercício que ilumina um horizonte de respostas existenciais qualificadas, configurando uma eficaz preparação para o Natal, com propósitos de reconciliação e disponibilidade para exercer a solidariedade.

A consolação aponta a possibilidade de se construir um tempo novo, com o milagre que transforma espadas em arados, demovendo mentes e corações da opção pelo conflito, por disputas fratricidas que destroem a amizade social. Ecoa, então, o convite: deixar-se guiar pela luz do Senhor. A luz que é Cristo Jesus, o Menino-Deus, em quem repousa a sabedoria e o discernimento, espírito de conselho e fortaleza, de ciência e temor a Deus. Luz que configura a dinâmica de uma nova lógica, aprendida na experiência do seu seguimento, impulsionando a urgência sábia de não se deixar convencer pelas aparências. Ao invés disso, priorizar a justiça para os humildes, com uma palavra vigorosa e transformadora. Aqueles que se deixam banhar pela luz do Salvador do mundo, conforme diz o profeta Isaías, destroem o mal com o sopro dos lábios, cingem suas cinturas com a correia da justiça e as costas com a faixa da fidelidade. O compromisso e os frutos daí decorrentes se revelam na imagem de um grande banquete de festa, diz o profeta, para firmar o sentido da verdadeira e duradoura consolação. “Um banquete de vinhos finos, de carnes suculentas”. Um banquete com assento para todos, não deixando valer a exclusão e a discriminação. Um banquete para celebrar a ação de Deus que vem, o Emanuel, Deus conosco, o único que pode definitivamente eliminar para sempre a morte, enxugar as lágrimas de todas as faces e acabar com a desonra de todo povo da terra.

A comprovação da consolação se fará pela confissão de Deus como único, aquele que é fidedigno, de confiança, razão de alegrias e exultação. A conquista será a configuração de um povo justo, cumpridor da palavra, firme nos bons propósitos, promotor da paz, pela fecundidade da confiança incondicional depositada no seu Deus e Senhor. A consolação é alimentada pela confiança de um novo tempo, abrindo-se a Deus, que é rocha firme. Ele é o Deus que humilha a cidade orgulhosa, deitando-a por terra até fazê-la beijar o chão, pisada pelos pés dos pobres e pelas passadas dos humildes. Compreenda-se, pois, que a experiência da consolação vem da graça de Deus, aquele que pode, como diz o profeta, transformar o Líbano em jardim, o jardim em floresta, fazendo chegar o dia em que surdos ouvirão, cegos verão no meio das trevas.

O caminho que leva a Deus fecunda e aumenta a alegria dos humildes, é razão do fracasso do prepotente, leva ao desaparecimento do trapaceiro e à ruina dos malfeitores. Ruína dos que armam ciladas e atacam o justo com palavras falsas. Assim, os que reconhecem e reverenciam as obras do Senhor serão consolados, com uma consolação que alavanca sabedoria até naqueles com espírito inconstante, instigando os maldizentes a apender a

verdade. Não há outro caminho para superar os motivos das lágrimas porque o Deus de toda consolação ouve o clamor de todos. A promessa é anunciada pelo profeta Isaías ao sublinhar que o caminho é para todos, basta nele seguir, sem desviar-se para qualquer lado. Pela poesia do profeta, revela-se a força da consolação vinda de Deus, ao afirmar que a lua brilhará como a luz do sol, e o sol brilhará sete vezes mais, no dia em que o Senhor curar a ferida de seu povo e sarar a lesão de sua chaga. Razões serão abundantes para criar ânimo e não ter medos porque Deus vem.

A partir das sugestivas imagens da terra árida transformada em lago, da região sedenta que se torna fontes de água; do caniço e do junco que crescem nas cavernas onde viviam dragões, o profeta Isaías delineia a fonte de consolação – o encontro com Deus. “Haverá aí uma estrada, um caminho, que será chamado caminho santo”. Os corações desolados pelas vicissitudes, pelos limites existenciais e humanos poderão se recuperar ganhando vigor pela fecundidade da experiência da espera do Senhor que vem. Então, é Natal de novo e de verdade. Adote-se a convicção orante e se proclame de todo o coração, o que indica a profecia de Isaías: “O Senhor é o Deus eterno, que criou os confins da terra. Ele não se cansa nem se afadiga, nem é possível sondar sua sabedoria. É ele quem dá força ao cansado, e recupera o vigor do enfraquecido. Até os adolescentes se afadigam e cansam, e mesmo os jovens às vezes tropeçam! Aqueles, porém, que esperam no Senhor, renovam suas forças, criam asas como de águia, correm e não se afadigam, caminham e não se cansam”. É Natal!

Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizon
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