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Advento: desejos novos

O tempo sagrado do Advento, preparação para a Festa do Natal do Senhor Jesus, Salvador, ultrapassa os desejos que se esgotam, as ofertas do comércio e os sonhos que o consumo alimenta. O Advento possibilita um indispensável confronto existencial com os anseios do coração que movem a existência de cada pessoa. A preparação para o Natal oferece, pois, a possibilidade de uma revisão interior, capaz de levar à qualificação existencial. O Advento bem vivido contribui para garantir que a interioridade sustente e contribua na conquista de uma alegria duradoura, reconfigurando os modos como o ser humano se relaciona consigo mesmo e com os seus semelhantes. Bem viver este tempo contempla o indispensável exercício de olhar a própria história, criteriosamente, para alcançar o sentido essencial à vida – o dom maior do tempo do Natal. Em contraponto às externalidades tão presentes neste tempo, deve-se dedicar atenção aos sentimentos – tecido frágil, mas essencial para conquistar liberdade e dar passos certeiros, firmes, distanciando-se da ilusão de onipotência. Uma ilusão que ronda sempre o coração. Ao contrário da onipotência, o ser humano, invariavelmente, é vulnerável, permanentemente confrontado com o vazio e a solidão. Por isso também reclama, sente incômodo. O desafio é alcançar o real sentido de uma solidão que é comum a cada pessoa.

Trata-se de um caminho para tratar expectativas adoecidas, que não alavancam a fonte genuína do sentido de viver. O Advento, então, guarda um horizonte de revisão de vida que abre corações para a disponibilidade de buscar reconciliações. Afinal, aquele que vem, o esperado das nações, vem, primordialmente, como instrumento da reconciliação, por meio da encarnação do Verbo, Deus que se faz humano. A reconciliação possibilitada pelo nascimento de Jesus é remédio eficaz na cura dos muitos adoecimentos que comprometem a fraternidade, que inviabilizam diálogos e proximidades com os diferentes, que restringem relacionamentos à “roda de amigos”. Para bem viver o Advento e o Natal, requer-se a disposição interior de afrontar as patologias da própria alma, reordenando o turbilhão dos próprios sentimentos e razões com o compromisso de assumir novas dinâmicas na própria vida. A reconciliação já configurada no Advento, em preparação para o Natal do Senhor, é alcançada pela compreensão lúcida e transparente sobre a razão do nascimento de Jesus. Todos precisam avançar na conquista dessa compreensão, para que o Natal não seja simplesmente mais uma celebração que passa fugazmente.

Bem viver o Advento inclui admitir que, na interioridade de cada pessoa, não habitam somente as coisas harmoniosas e belas. A interioridade precisa de tratamento terapêutico para superar patologias antigas e novas. Um tratamento possível graças a Jesus – Aquele que vem – ensinando caminhos de reconciliação que levam luz à interioridade humana. O convite-convocação do Advento é deixar-se reconciliar, partindo de uma profunda consciência sobre os próprios limites. Permitir-se moldar por uma abertura amorosa à vida. Uma experiência de cura a partir da misericórdia que nasce do Deus que vem encontrar a humanidade, luz que dissipa sombras existenciais. Ele, Cristo, o único Salvador, resgata cada pessoa. A partir do Advento, todos têm a oportunidade de recompor-se na unidade interior, ainda que esta unidade esteja devastada pela força de desejos envelhecidos, que causam adoecimentos crônicos. Adoecimentos que podem ser sentidos na “própria pele”, levando a fechamentos e narcisismos, a preconceitos e à falta de diálogo. Sem a recomposição da unidade interior, a vida fica aprisionada, reduzida a consumos, a ilusões oferecidas pela vaidade e pelo poder que alimentam disputas. Essas ilusões apenas alimentam a inveja e o desassossego, gerando novas patologias e incômodos.

É urgente zelar pela qualidade dos próprios desejos, que não podem estar restritos ao consumo ou a tudo que é efêmero. Cultivar desejos novos, a partir dos próprios direitos e deveres, reconhecendo-se como importante parte de um horizonte maior. Compreende-se esse horizonte com o reverente olhar voltado para o Pai que envia Seu Amado Filho, como Salvador e Redentor. Essa reverência pode adequadamente modular o relacionamento humano, tornando-o mais generoso, marcado pela capacidade de perdoar. A reverência a Deus – que faz a vida humana ser, de fato, vivida como dádiva – deve marcar o tempo do Advento, que oferece a possibilidade para serem cultivados desejos novos, configurados a partir do nascimento de uma esperança que ilumina. Experimenta-se, assim, um sentimento de gratidão ao Pai que transforma e redime todo coração, deixando-se banhar pelo gesto misericordioso do Deus-Menino, luz do alto, sol nascente, que vem visitar a humanidade. Uma gratidão que abastece a alma de misericórdia, indispensável para construir um mundo novo – forte na reconciliação. Uma gratidão misericordiosa que não obscurece e nem relativiza o bem recebido. Ao invés disso, fecunda o caminho da reconciliação – sentido genuíno do Natal, verdadeiramente feliz.

Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte

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